Fisioterapia nas Doenças Hipertensivas Específicas da Gravidez

Doenças Hipertensivas


INTRODUÇÃO

Braga citado por Kahhale e Zugaib (2000, p.524) afirma que as síndromes hipertensivas são as complicações mais freqüentes na gestação e constituem no Brasil, a primeira causa de morte materna, principalmente quando se instalam nas suas formas mais graves como a eclâmpsia e a síndrome HELLP.

A gestação pode agravar a hipertensão existente antes da gravidez, bem como induzi-la em mulheres normotensas. Na primeira, a elevação da pressão arterial é o aspecto fisiopatológico básico da doença, a última é resultado de má adaptação do organismo materno à gravidez, sendo a hipertensão apenas um de seus achados (Peraçoli e Rudge, 2000).

CONCEITUAÇÃO:

A hipertensão arterial na gravidez é definida como a manifestação persistente de níveis de pressão arterial sistólica e/ou diástolica iguais ou superiores a 140/90 mmHg, sendo também considerada a hipertensão arterial a elevação de pelo menos 30 mmHg na pressão sistólica e/ou 15mmHg na diastólica, em relação ao menor valor registrado no segundo trimestre da gestação.

Identificar o tipo de distúrbio hipertensivo é fundamental, pois a repercussão perinatal e o esquema terapêutico são diferenciados.

Hughes citado por Peraçoli e Rudge (2000) propôs uma classificação que foi referendada pelo American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG):

* Hipertensão arterial crônica;
* Hipertensão induzida pela gestação;
* Pré-eclâmpsia/eclâmpsia;
* Hipertensão arterial crônica superposta por hipertensão induzida pela gestação;
* Hipertensão arterial crônica superposta por pré-eclâmpsia/eclâmpsia;
* Síndrome HELLP.

Para que essa classificação seja aplicada de maneira correta, alguns conceitos devem ser seguidos:

* Hipertensão arterial crônica: quando há história de hipertensão arterial, de qualquer etiologia, anterior à gestação, ou registro de pressão arterial de 140/90 mmHg ou mais, antes da 20ª semana de gestação, ou quando diagnosticada pela primeira vez na gestação, persiste além do 42º dia do puerpério (Peraçoli e Rudge, 2000).
* Hipertensão induzida pela gestação: quando não há história de hipertensão arterial anterior à gestação.
* Pré-eclâmpsia/eclampsia: definimos pré-eclâmpsia como a doença privativa da prenhez, particularmente de nulíparas que aparece após 20 semanas, mas assídua perto do termo, tendo como tríade sintomática característica a hipertensão, o edema e a proteinúria (Rezende, 1987). A eclâmpsia é a ocorrência de convulsões em paciente com pré-eclâmpsia que não possa ser atribuído a outras causas.
* Hipertensão arterial crônica superposta por hipertensão induzida pela gestação: quando na presença de HAC, após a 20ª semana de gestação, ocorre exacerbação dos níveis de pressão arterial, edema generalizado ou elevação de ácido úrico, na ausência de proteinúria.(Peraçoli e Zugaib, 2000).
* Hipertensão arterial crônica superposta por pré-eclâmpsia: quando na presença de HAC, após a 20ª semana de gestação, ocorre aparecimento de proteinúria. (Peraçoli e Zugaib, 2000).


PRÉ-ECLÂMPSIA:

A etiologia da pré-eclâmpsia ainda é desconhecida. Aspectos imunológicos, genéticos e falha na placentação são, atualmente aceitos unanimente. (Kahhale e Zugaib, 2000).

Greer citado por Kahhale e Zugaib (2000, p. 525) afirma que sua fisiopatologia envolve lesão endotelial difusa comprometendo a integridade do sistema vascular, a produção de vasodilatadores endógenos e a manutenção da coagulação com danos principalmente para o rim, sistema nervoso central, fígado e placenta; como resultado, as pacientes podem apresentar envolvimento de múltiplos órgãos com diferentes graus de gravidade.

A incidência aumenta em primigestas, pacientes com história familiar de pré-eclâmpsia/eclampsia, pacientes com pré-eclâmpsia anterior, pacientes trofoblástica (gestação múltipla, hidropisia não-imune, gestação molar, triploidia fetal), diabetes.

Na gestação normal ocorrem modificações fisiológicas induzidas por uma interação entre o feto e os tecidos maternos. Desde o primeiro trimestre as artérias espiraladas são invadidas por tecido trofoblástico, transformando o leito dessas artérias uteroplacentárias em sistema rígido de baixa resistência, baixa pressão e fluxo elevado (Brosens citado por Kahhale e Zugaib, 2000, p. 525).

Nas modificações bioquímicas há predominância da ação vasodilatadora por aumento da prostaciclina (PGI2) produzida pelas paredes dos vasos sobre a ação vasoconstritora e agregadora plaquetária do tromboxano (TXA2), produzido pelas plaquetas (Kahhale e Zugaib, 2000). Outras alterações incluem a elevação do volume plasmático e débito cardíaco, além de modificações do sistema renina-angiotensina-aldosterona.

As alterações fisiológicas características da pré-eclâmpsia são falhas das respostas compensatórias vistas na gestação normal. (Kahhale e Zugaib, 2000).

Khong citado por Kahhale e Zugaib (2000, p. 525) afirma que a invasão do trofoblasto nas artérias espiraladas é incompleta ou mesmo ausente e conseqüentemente não há vasodilatação. Simultaneamente há queda dos níveis de prostaciclina na circulação materna e aumento da ação do tromboxano, resultando em aumento da reatividade vascular.

Walter citado Kahhale e Zugaib (2000, p. 526) afirma que a expansão do volume plasmático, que alcança 50% na gestação normal, é menor ou inexistente na pré-eclâmpsia. Chesley citado por Kahhale e Zugaib (2000, p.526) afirma que o número de glóbulos vermelhos não se altera e, conseqüentemente eleva-se o hematócrito, e com ele, a viscosidade sanguínea, com risco aumentado para fenômenos trombóticos. Easterling citado por Kahhale e Zugaib (2000, p.526) afirma que o débito cardíaco pode estar aumentado diminuído ou normal, quando comparado com a gestação normal.

Ao contrário da gestação normal os achados hemodinâmicos na pré-eclâmpsia demonstram redução do volume sanguíneo, aumento da resistência periférica e elevação da pressão arterial.

A pré-eclâmpsia apresenta proteinúria em função da lesão em nível glomerular denominada de "endoteliose capilar glomerular". É uma lesão reversível após o término da gestação, usualmente após 1 semana de pós-parto, em alguns casos podendo permanecer por mais de 1 mês. (Rezende, 1987).

A circulação uteroplacentária está reduzida, o que explica a incidência expressiva de crescimento retardado da placenta e seu deslocamento prematuro, determinantes do sofrimento fetal crônico e do elevado obituário perinatal (Rezende, 1987).

ECLÂMPSIA:

Definida como a manifestação de convulsões e/ou coma não relacionados a outras condições cerebrais, durante o ciclo gravídico-puerperal, em pacientes com sinais e sintomas de pré-eclâmpsia, podendo ocorrer na gestação, no trabalho de parto e no puerpério (Rudge, Peraçoli e Cunha, 2000).

As convulsões da eclampsia podem ocorrer sem sinal prévio, mas alguns sintomas premonitórios devem servir de alerta para a iminência dessas complicações: distúrbios nervosos centrais como cefaléia occipital de forte intensidade e persistente, mudança de comportamento tanto para o lado da agitação como da obnubilação e torpor; distúrbios visuais como borramento da visão, escotomas, fotofobia; dor epigástrica ou no quadrante superior direito do abdome, náuseas e vômitos (Rudge, Peraçoli e Cunha, 2000).

A profilaxia da eclampsia tem sido tentada por meio da administração de ácido acetil salicílico, cálcio e óleo de peixe. A assistência pré-natal precoce e adequada, com hospitalização precoce e liberal tem contribuído para a diminuição da ocorrência dessa complicação.

SÍNDROME HELLP:

São as iniciais usadas para descrever a condição de paciente com pré-eclâmpsia grave que apresenta hemólise (H), níveis elevados de enzimas hepáticas (EL) e número baixo de plaquetas (LP). (Rudge, Peraçoli e Cunha, 2000).

Em sua fisiopatologia a doença é identificada como um processo de anemia hemolítica microangioática que pode acelerar e progredir para suas formas mais graves, caracterizadas por graus variados de coagulação intravascular disseminada (Oian citado por Rudge, Peraçoli e Cunha, 2000, p. 531).

Na síndrome HELLP há ativação intravascular das plaquetas e lesão endotelial. A ativação plaquetária determina liberação de tromboxano, causadora de vasoconstrição, agregação plaquetária e mais lesão endotelial (Rezende, 1987).

São sintomas típicos da síndrome a cefaléia, dor epigástrica ou no quadrante superior direito do abdome, náuseas e vômitos. A hipertensão está ausente em 20% dos casos e é leve em 30%.

DIAGNÓSTICO:

Em pacientes examinadas desde a primeira semana de gestação e normotensas, o diagnóstico é sugerido ao aparecer hipertensão após 24 semanas de prenhez. (Rezende, 1987).

São exames complementares valiosos o teste de hipertensão supina, o exame do fundo-dos-olhos, a biópsia renal e o doppler (Rezende, 1987).

* Teste de hipertensão supina: permite prever o aparecimento da DHEG mais tarde. Considera-se o exame positivo quando se mudando a paciente do decúbito lateral para o dorsal a tensão diastólica eleva-se de no mínimo 20 mmHg.
* Exame do fundo-dos-olhos: traduz o espasmo arteriolar. Nos casos mais graves há edema de papila, exsudatos em "flocos de algodão", hemorragia em "chama de vela" e edema sub-retiniano.
* Biopsia renal: documenta a lesão glomerular toxêmica.
* Doppler: Doppler das artérias uterinas, que traduz a presença de incisura bilateral no início da diástole.

PROGNÓSTICO:

Materno:

O prognóstico vincula-se à presença da crise convulsiva. A mortalidade materna na eclâmpsia é elevada (10-15%), enquanto que na pré-eclâmpsia torna-se mais grave quando sobrevém a síndrome HELLP. A maior causa de morte na eclâmpsia é a hemorragia cerebral (60%) seguida por edema agudo de pulmão. (Rezende, 1987).

Fetal:

As alterações placentárias ocasionam sofrimento crônico do concepto, que tem o seu crescimento intra-uterino restrito e pode morrer in útero. (Rezende, 1987).

TRATAMENTO FISIOTERAPÊUTICO:

Objetivos: (Kissner e Colby, 1998).

* Diminuir a rigidez, através de mobilidade articular na amplitude possível;
* Melhorar a circulação, através de exercícios de alongamento e fortalecimento dentro dos limites impostos pelo médico;
* Aliviar o tédio, com várias atividades e posicionamento para os exercícios;
* Manejo do stress e aumento do relaxamento, através de técnicas de relaxamento;
* Preparação para o parto, com orientações sobre o parto, treino respiratório, e exercícios para assistir e preparar para o parto.

Orientações e precauções: (Kissner e Colby, 1998).

* Todos os programas de exercícios devem ser estabelecidos individualmente, com base no diagnóstico, limitações, avaliação fisioterapêutica. As atividades precisam ir ao encontro das necessidades da paciente mas não devem complicar ainda mais a condição.
* A paciente precisa ser monitorada de perto durante todas as atividades.
* Alguns exercícios, especialmente os abdominais podem simular as contrações uterinas e devem ser modificados ou interrompidos.
* Qualquer sangramento ou perda de líquido amniótico precisa ser monitorado e relatado.
* Não deve ser permitida manobra de Valsalva.
* Os exercícios devem ser lentos, homogêneos e simples e devem requerer o mínimo de esforço.

Sugestões de Programas de Exercícios:

A paciente deve ser posicionada em decúbito lateral esquerdo para evitar compressão da veia cava, aumentar o débito cardíaco e diminuir o edema nos membros inferiores. Se colocada em decúbito dorsal, uma toalha deve ser colocada no quadril para diminuir a compressão na veia cava inferior.

* Respiração: O ideal é que se use a respiração diafragmática, concentrando-se na expiração, tentando manter o corpo (principalmente os ombros) relaxado. A gestante deve ser orientada para emitir sons tais como gemer, grunhir, sibilar, cantar e ao mesmo tempo gritar e quando as contrações se tornarem muito fortes não tentar coibir essa necessidade que pode ajudar a diminuir as dores (Balaskas, 1991).
* Relaxamento.

CONCLUSÃO

O profissional fisioterapêutico obstétrico desempenha um papel importante relacionado a gestantes. Ele procura proporcionar um meio que gere condições físicas e emocionais, trazendo muitas vezes o apoio e o conforto na hora da dor, pois o nervosismo, a ansiedade e a falta de preparação para o parto, interagem diretamente no decorrer do transcurso, no que diz respeito ao trabalho do parto.



REFERÊNCIAS

FEBRASG. Tratado de obstetrícia. Rio de Janeiro: Revinter, 2000.

KISNER, Carolyn, COLBY, Lynn A. Exercícios terapêuticos. 3. ed. São Paulo: Manole, 1998.

REZENDE, Jorge de O., MONTENEGRO, Carlos A. B. Obstetrícia fundamental. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1987.

PERAÇOLI, José C., RUDGE, Marilza V. C.Como diagnosticar e tratar hipertensão arterial na gravidez. www.cibersaude.com.br. [10 ago. 2002].