Artrite Reumatóide Juvenil

1.1 DEFINIÇÃO

É uma artrite de origem desconhecida, que ocorre em crianças abaixo dos 16 anos de idade, persiste por um mínimo de seis semanas e se define como edema ou dor e limitação de movimentos em pelo menos uma articulação. A artrite reumatóide juvenil ou artrite crônica juvenil é uma doença auto-imune, produzida pelo sistema imunológico da criança. As células de defesa, que normalmente são formadas para defender o organismo das infecções ou das agressões externas, passam a agredi-lo. É uma doença inflamatória crônica que não é fatal mas caso não seja tratada precocemente, pode acarretar prejuízos permanentes.


1.2 FISIOPATOLOGIA

O aspecto mais proeminente e usual é o de sinovite. A sinovial torna-se edemaciada e avermelhada e as vilosidades aumentam em volume, ocupando grande parte da cavidade articular. A articulação fica distendida porque, além da sinovial estar inflamada e hipertrofiada, ultrapassando o espaço normalmente existente, há um aumento do líquido sinovial, que fica turvo e com menor viscosidade. As vilosidades sinoviais, de início, recobrem frouxamente a cartilagem articular para, a seguir, aderirem firmemente margens cartilaginosas, substituindo-as. Adotando um caráter circunferencial, o tecido sinovial cresce, cobrindo a cartilagem, ligando-se de tal maneira que ela não pode ser destacado.

Por razões ainda não bem esclarecidas, logo de início os ligamentos ficam frouxos, os músculos se atrofiam e a pele que recobre a articulação torna-se tensa e atrófica. O osso torna-se osteoporótico e o tecido de granulação sinovial pressiona-o: sob a ação do movimento articular há penetração do pannus e do líquido sinovial, originando-se pseudocistos intra-ósseos.

A cavidade articular enche-se de fibrina, que se organiza e oblitera a articulação, começando o processo de anquilose. Nessa fase crônica o edema vai regredindo, as vilosidades tornam-se menos proeminentes e pálidas e a grande efusão sinovial cede, como se estivesse evitando a formação de aderências.


1.3 INCIDÊNCIA

A artrite reumatóide juvenil é uma doença relativamente rara. Na Inglaterra a incidência varia de 0.06% a 0.1% e nos Estados Unidos de 0.01% a 0.11% da população infantil até 15 anos. Seis a oito casos novos para uma população de 100.000 crianças abaixo de 15 anos aparecem anualmente na Finlândia. Os picos de maior incidência pela idade estão entre 1 à 5 e de 10 a 14 anos. O sexo feminino tem uma maior incidência, que varia de 1.5:1 à 3.0:1, havendo um equilíbrio entre os sexos nos casos de forma sistêmica.


1.4 EPIDEMIOLOGIA

A doença acomete qualquer raça. Pode ocorrer em qualquer idade antes dos 16 anos de idade, com predominância no sexo feminino, na relação de 1:3:1.


1.5 ETIOLOGIA

É ainda obscuro o agente etiológico da artrite reumatóide juvenil. Apontam-se diversos fatores, porém não há nada de conclusivo. Já foram evocados, entre outros, a infecção, os traumatismos, os distúrbios psíquicos, a hereditariedade, etc.

Alguns dados sugerem que existem correlações entre hereditariedade e artrite reumatóide. Observações clínicas, mostram que nas famílias de enfermos reumatóides, a positividade do fator reumatóide é maior do que em indivíduos sãos.

Os agentes infecciosos bacterianos ou virais são freqüentemente imputados como causadores. Entretanto, até o presente, nenhum gérmem que pudesse ser responsabilizado pela etiologia foi isolado.

Um fator que não deve ser esquecido é a problemática emocional dos enfermos, que pode desencadear a doença.

O mecanismo imunopatológico da ARJ é desconhecido. Entretanto sabe-se, atualmente que existem defeitos relacionados com a imunidade humoral (medida por linfócitos B) e a imunidade celular (mediada por linfócitos T). As alterações da imunidade mais conhecida são:

  • Hipergamaglobulinemia ocasionada pela super produção de anticorpos do tipo IgG, IgM, IgA.
  • Uma porcentagem de crianças, principalmente do sexo feminino e com comprometimento oligoarticular, apresentam fator antinuclear (FAN) positivo.


1.6 SINAIS E SINTOMAS

Depende do tipo da artrite e da intensidade do acometimento. Os sintomas mais comuns são dor e inchaço das articulações. Também pode ocorrer febre, vermelhidão na pele (rash cutâneo), aumento dos gânglios, aumento do fígado e baço.


1.7 DIAGNÓSTICO

A Artrite reumatóide juvenil é uma doença de diagnóstico difícil. Freqüentemente as crianças diminuem os movimentos nas articulações acometidas, e não reclamam de dor. Mudanças no jeito de andar, queixa de articulações duras quando a criança acorda ou relutância para usar um braço ou perna podem ser dicas importantes para o diagnóstico.

O processo articular inflamatório deve ser persistente, com duração mínima de 6 semanas, e algumas manifestações tais como rigidez matinal, febre intermitente, pericardite, espondilite visceral e nódulos reumatóides.

A idade sendo menor do que 16 anos, e a exclusão de outras doenças que provocam artrite juvenil, também fazer parte do diagnóstico.

Existem ainda três tipos de início, perfeitamente definidos que ajudam no diagnóstico da ARJ.

Inicio Sistêmico:

É a forma mais grave e menos comum, compreendendo em torno de 20% dos casos de ARJ. Acomete a criança em qualquer idade e igualmente os dois sexos, sendo que as grandes articulações são as mais freqüentemente envolvidas. A febre está sempre presente e é geralmente combinada com eritema, artrite ou artralgia, linfadenopatia, esplenomegalia, hepatomegalia, dor abdominal ou pericardite.

A febre é de caráter intermitente e pode atingir até 41ºC, com retorno ao normal em poucas horas.Durante este período a criança parece às vezes muito mal, mas tem uma melhora considerável quando a temperatura volta ao normal. Esses picos febris podem aparecer duas vezes ao dia, em alguns casos.

Início Poliarticular:

É caracterizada por acometimento de varias articulações, especialmente as pequenas. Os sintomas articulares já predominam desde o inicio e as manifestações sistêmicas são geralmente discretas. Predomina no sexo feminino e pode iniciar em qualquer idade e geralmente de modo insidioso. Esse grupo é dividido em subtipos I e II conforme o fator reumatóide seja negativo ou positivo.

Subtipo I – Poliarticular com fator reumatóide negativo.

Aparece em crianças mais novas, antes dos 6 anos, e a evolução articular é menos grave. É predominante em meninas, de inicio insidioso, acometendo as pequenas articulações das mãos e pés, joelhos, punhos, tornozelos e cotovelos.

Subtipo II – Poliarticular com fator reumatóide positivo.

A idade de inicio é acima dos 10 anos, com predomínio no sexo feminino e a atividade é mais intensa com destruição articular maior, presença de nódulos reumatóides subcutâneos e uma incidência maior de vasculite.

Acomete principalmente punhos, seguindo-se joelhos, cotovelos, tornozelos e quadris.

Início Pauciarticular

O inicio é também insidioso e acomete articulações maiores. Podemos considerar também dois subtipos.

Subtipo I

Acomete crianças mais novas (antes dos 5 anos), nas quais a incidência de iridociclite crônica é bastante alta, sendo que 80% das crianças são portadoras de anticorpos antinucleares.

A evolução articular é geralmente benigna, com limitação de atividade somente em poucos casos, e a mortalidade é mínima bem como as manifestações sistêmicas. O grande risco nesse subtipo é o aparecimento da iridociclite crônica, que pode levar a uma limitação ou mesmo perda da visão, em grande parte dos casos.

Subtipo II

Acomete crianças acima dos 10 anos, e predomina do sexo masculino. A pesquisa de fatores reumatóides e antinucleares é negativa. Há comumente acometimento das articulações sacrilíacas e em especial joelhos e tornozelos, e muitos casos evoluem mesmo para a espondilite anquilosante. Nesses casos pode aparecer iridociclite aguda.


1.8 QUADRO CLÍNICO

A doença tem um curso muito variado, indo de casos que evoluem espontaneamente para a cura, até àqueles que cursam com importantes deformidades do aparelho locomotor. Podem aparecer complicações viscerais que algumas vezes, levam ao óbito. A forma de aparecimento pode ser mono, oligo ou poliarticular. Iniciando de forma insidiosa ou aguda, com ou sem manifestações sistêmicas. Os nódulos subcutâneos são uma manifestação bastante freqüente. A rigidez matinal é um dos primeiros sinais da doença que acomete, principalmente, nas articulações interfalangianas e nas metacarpofalangianas das mãos, geralmente simétricas. Punhos e pés também são bastante acometidos. Pode ocorrer febre e mialgias. Vasculites podem aparecer, principalmente, nos membros inferiores e são sempre um sinal de gravidade da doença.

Quando há queda do estado geral, a crise surge com febre alta, rash, artralgias, pericardite fugaz e, mais tarde uma articulação é acometida de modo persistente. Outras vezes as manifestações extra-articulares, como iridociclite e pericardite, podem preceder, em semanas ou meses, o ataque às articulações.

A febre que algumas destas crianças apresentam é bastante característica, costuma ser alta, em torno de 39 a 40º C, geralmente aparece sé uma vez ao dia, no final da tarde, e costuma desaparecer com o uso de antitérmicos. Durante o pico febril, a criança fica bastante caída, porém com a diminuição da temperatura ela volta a ser ativa como antes. Outro dado que se deve chamar a atenção para esta doença é que a erupção cutânea aparece ou fica mais intensa durante o pico de febre.


1.9 TRATAMENTO

Tudo que se almeja no tratamento da ARJ é que a criança possa viver o mais normalmente possível, no meio familiar e social.

O tratamento visa controlar a doença, suprimir a atividade, evitar e prevenir as deformidades, manter o paciente na família e freqüentando a escola e permitir um desenvolvimento físico e afetivo adequado. É essencial estar convicto de que o uso de drogas é apenas uma parte do tratamento, e tão ou mais importantes são as medidas como suporte psicológico, repouso e exercícios adequados, uso de talas e aparelhos e, às vezes, cirurgia.

O repouso é indicado na fase de grande atividade da doença, quando a dor é muito intensa ou haja deformidades nas articulações dos membros inferiores. Muito comum é o aparecimento de lesões irreversíveis, contraturas, deformidades, anquiloses, desgastes musculares e ósseos, escaras e mesmo cálculos renais, por repouso prolongado no leito. Posições completas para se impedir deformidades nas articulações acometidas devem ser observadas durante o período de repouso.

Os exercícios devem ser diários para se evitar as hipotrofias musculares e contraturas.

O emprego de talas ou aparelhos de reabilitação é de grande importância para impedir ou corrigir deformidades, tanto na fase aguda como crônica da doença. O tipo e o tempo de uso dependem muito do objetivo que se deseja alcançar: repouso articular, redução da inflamação, impedir ou corrigi deformidades ou melhorar a função. Todo esforço deve ser feito para que as articulações sejam colocadas na sua posição de função, o que varia de uma para outra. A tala pode ser retirada para o movimento da respectiva articulação e recolocada.

Aparelhos estáticos e dinâmicos são usados, dependendo da necessidade e tolerância do paciente, e só muito raramente a manipulação sob anestesia geral é realizada.

O uso da termo e crioterapia deve ser bem criterioso par evitar o agravamento de uma inflamação, o que pode acontecer com a diatermia. A crioterapia com álcool ou gelo às vezes dá muito bom resultado na inflamação aguda.


1.10 PROGNÓSTICO

É bastante variável, dependendo dentre outros fatores do diagnóstico e instalação precoce da terapêutica, visando diminuir a morbidade da doença.

Quanto menor a idade de início, pior é o resultado final. Se tiver início sistêmico, essas crianças geralmente evoluem mal e, se tiver início poliarticular, o prognóstico é melhor, mas uma proporção de crianças tem anomalias do crescimento e maxilares em retrognatia.

Existem pacientes que entram em remissão de doença. Os critérios adotados para remissão são:

1. Rigidez matinal inferior à 15 minutos;

2. Ausência de dor articular;

3. Ausência de fadiga;

4. Ausência de dor a movimentação;

5. Ausência de edema articular;


BIBLIOGRAFIA:

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